Antes de serem lidos, todos os livros encerram um potencial de nos poder vir a agitar o espírito, de nos ensinar, ou até assustar. Fazem-nos sonhar, sorrir, gargalhar e até chorar. Depois de lidos, muitos deles ficam connosco para sempre. Um punhado mais restrito altera a maneira como pensamos e por isso mudam também aquilo que somos. Tal como acontece com algumas das pessoas com quem nos cruzamos na vida, alguns livros são verdadeiros pontos de viragem. São como o fim ou princípio de capítulos que dividem a nossa existência em partes distintas, como se tudo se resumisse a um antes e depois de cada um deles.
Lembro-me de haver sempre livros à minha volta. Quando era pequeno eles eram muito poucos e por isso muito mais preciosos. A escassez fazia-os gozar de uma procura que levava a que fossem partilhados repetidamente.
Ainda antes de eu saber ler, o meu irmão e o meu primo já tinham lido todos os livros que existiam nas duas casas. Sempre que o magro espólio era aumentado nenhum dos dois aceitava esperar pelo outro e acabavam a ler em simultâneo. O mais rápido esperava uns segundos pelo outro para só então se virar a página. Lembro-me de os ver assim, sentados no último degrau da escada, lado a lado, ora a interiorizar a mensagem ora a ver qual dos dois lia mais rápido. Tal como na natureza, após a escassez vem a sofreguidão. Para saborear não se pode ter fome e eles, que já salivavam antes de abrir a primeira página, liam tudo sem mastigar e sem se preocupar com a digestão.
Eu via aquilo e queria também poder aceder àquele mundo que só existia quando as páginas se abriam. Esse mundo era frequentado por diversas pessoas da família de diferentes gerações. A muito partilhada lista de títulos fazia dos nossos livros um ponto de passagem que mais tarde ou mais cedo todos palmilhavam. Tornava-se por isso também num ponto de encontro.
Quando finalmente aprendi a ler, a lista do títulos disponíveis nas nossas casas já era um pouco mais generosa e foi crescendo sempre sem nunca mais parar. Nunca tive de ler à desgarrada e nunca soube de mais ninguém que o tivesse feito.
Olhando para as gerações mais recentes, nenhum membro da nossa família alargada partilha o gosto por ler com semelhante intensidade. Todos consomem a maior parte dos tempos livres à frente de ecrãs.
Será que estamos a caminho de um mundo onde, como antes de Gutemberg, os livros voltarão ser lidos apenas por uma minoria?
Da mesma forma que a fotografia não matou a pintura, nem a televisão matou o cinema, também não serão os suportes electrónicos que matarão o livro. Mas mais do que perguntar se os novos suportes são complementares ou alternativos ao livro impresso, a dúvida que me coloco reside na capacidade e na disponibilidade intelectual de quem cresce como espectador passivo em frente de ecrãs. Que capacidade de interpretar, ou até de fantasiar, sobre o que do passado chegou até aos nossos dias terá quem não conhece o cheiro dos livros?
Leitura diária
Debaixo de olho
O Futuro e os seus inimigos
de Daniel Innerarity
Um livro que aposta numa política do optimismo e da esperança numa ocasião em que diminui a confiança no futuro. Boa parte dos nossos mal-estares e da nossa pouca racionalidade colectiva provém de que as sociedades democráticas não mantêm boas relações com o futuro. Em primeiro lugar, porque todo o sistema político, e a cultura em geral, estão virados apenas para o presente imediato e porque o nosso relacionamento com o futuro colectivo não é de esperança e projecto mas de precaução e improvisação. Este livro procura contribuir para uma nova teoria do tempo social na perspectiva das relações que a sociedade mantém com o seu futuro: de como este é antevisto, decidido e configurado. Para que a acção não seja reacção insignificante e o projecto se não converta em idealismo utópico, é necessária uma política que faça do futuro a sua tarefa fundamental
Teorema
Cachimbos: Marcas, Fabricantes e Artesãos
de José Manuel Lopes
O mais completo livro sobre cachimbos, da autoria do jornalista José Manuel Lopes, presidente do Cachimbo Clube de Portugal. Profusamente ilustrada, esta obra a que poderíamos chamar enciclopédica, dá-nos ainda em anexo uma completíssima lista de clubes e associações do mundo inteiro e dos seus sites.
Quimera