Actualidade e lugares
Quinta-feira, 14 de Abril de 2011
Um texto para reler daqui a algum tempo e entender o presente de então

A avaliar pelos lamentáveis episódios dos últimos dias, já dá para perceber que esta campanha eleitoral promete ser lamentável. A única maneira de não se discutirem os problemas do País será discutir até à náusea todos os assuntos irrelevantes. E é isso que os socialistas tentarão fazer.

Trata-se de um sintoma de uma patologia cada vez mais crónica na nossa sociedade, a negação da realidade. Existe muito nas famílias divididas, nos casais à beira do divórcio, nas empresas perto do colapso, nos países com más elites.

Fala-se durante tempos imensos sobre coisas laterais e escondem-se os temas importantes. O que possa ser incómodo é ignorado.

A crise não explica tudo, sobretudo não explica o clima de violência verbal quando estala o verniz numa simples conversa sobre clubes de futebol. Imagino que o mal seja mais profundo e que muitos portugueses, de facto, acreditem que estamos a entrar num período de declínio irreversível. Um deslizar fatalista para o desastre.

Os eleitores sabem que isto falhou tudo, que estão perante a perspectiva do empobrecimento acentuado num horizonte de uma década, mas a responsabilidade é algo difusa, imprecisa. Ouvimos dizer que "a culpa é de todos" e questionamo-nos sobre a nossa culpa. "Que fiz eu de errado, senão trabalhar como um louco e para o país acabar nisto?"

Ao fim de um ano de sacrifícios mal distribuídos, estamos perante a perspectiva de um resgate internacional onde aparecemos como pedintes irresponsáveis. Os nossos parceiros europeus (supostamente mais do que simples aliados) humilham-nos como não aconteceu em intervenções anteriores. E, desta vez, não temos a margem de manobra do passado, não podemos desvalorizar a moeda, sendo a dívida bem mais elevada.

Seria lógico que o País estivesse a discutir o seu modelo económico, que fracassou em toda a linha; a mudar tranquilamente as elites políticas, que não souberam ou não quiseram actuar. Mas parece existir uma paralisia da inteligência que transforma todos debates em berratas laterais, todas as discussões em trincheiras. 

Os socialistas estiveram no poder nos últimos seis anos e presidiram a um processo de endividamento sem precedentes, surdos a todos os avisos, concentrados em satisfazer a avidez das suas clientelas. E, no entanto, a comunicação social parece aceitar bovinamente que não haja discussão sobre esta herança.

A negação da realidade que se instalou nos últimos anos é um fenómeno muito perigoso. Nas famílias divididas acaba em zangas de décadas; os casais, em divórcios mais dolorosos, com as crianças transformadas em armas de arremesso. As empresas e os países, esses, caminham para a falência e para o conflito civil.

Encarar a realidade é a nossa única saída. Os portugueses devem exigir uma campanha política transparente e verdadeira, que discuta de forma séria e compreensível como foi cavado este buraco e como é que o País sai dele. Os eleitores devem punir quem tentar desviar as atenções do essencial: da crise, dos seus efeitos e das opções que se colocam para a resolver.

 

Roubado ao Luis Naves daqui.



publicado por Paulo Sousa às 08:00
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Obrigado Laura,Apenas aqui poderia ter chegado pel...
magnífico texto.Cheguei aqui através do "Delito".
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Se o discurso do sr burlão da ONU fosse de apoio a...
Um título alternativo: "A realidade não é uma cons...
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