Das secretas
(...) Diz-se nestas situações que o que interessa são os factos. O regime, porém, nunca demonstrou ter meios para apurar factos em qualquer "caso". Debates, inquéritos ou processos acrescentam apenas confusão à confusão. Resta por isso, a quem não queira simplesmente exercitar simpatias ou rancores, falar de generalidades. E a generalidade, neste caso, é qua a democracia, tal como os regimes antecessores, não gerou um Estado credível e uma sociedade civil forte. O Estado, gigantesco, passa por todos os negócios, confundido com todos os interesses. Por isso se é verdade que temos um sistema eleitoral justo e limpo, o resto tende a ser nebuloso.
Portugal não é a Rússia. Juntam-se dossiês, não se manda dar tiros. Mas só eleições não fazem uma democracia. Uma democracia requer instituições com formalidades, separação de esferas, controlo de qualidade e de isenção. Precisa, acima de tudo, de dar espaço aos cidadãos para por si próprios, afirmarem a sua independência, sem terem que procurar favores ou temer retaliações. (...)
Rui Ramos, Expresso
Roubado daqui
Caprichosa realidade
São indisfarçáveis os arrepios de excitação dos cúmplices ou protagonistas da desgovernação das últimas décadas com manchetes tipo “o regresso dos indignados”. No caso é à Puerta del Sol em Madrid, mas poderiam referir-se às dezenas de campistas no Parque Eduardo VII ou a um qualquer grupelho de alienados na Praça Luís de Camões. O “cheiro a sangue” provoca uma reacção pavloviana no jornalismo tuga. Talvez seja afinal o caos a ignição da tão proclamada “Agenda do Crescimento”... nos primeiros tempos até ajuda a vender jornais.
A montante de tudo isto está o enorme equívoco que constitui para a Democracia, a proverbial insubordinação do regime à “realidade”. Como referia o historiador Rui Ramos Sábado na sua coluna do expresso (nutro infinitamente mais apreço por um analista político que consagre a sua vida à investigação da História) “a democracia não é só vontade e representação, esta não pode ser a negação da realidade”, uma perspectiva que fatalmente constitui a sua própria condenação. Acontece que "os cidadãos ocidentais foram educados na crença de que a realidade é uma construção ideológica, e que portanto, pelo singelo expediente de "fazerem ouvir a sua voz" está aos seu alcance tornar as coisas e as pessoas no que mais lhes convém." De facto, "os políticos" teimam vender promessas impossíveis para vencer eleições e foi essa lunática estratégia mais o crédito barato que nos trouxe à falência. Uma estratégia que descredibilizou o regime e hoje coloca em risco a nossa liberdade, à mercê de qualquer grupelho marginal mais aguerrido ou violento.
De facto acabou o dinheiro fácil, o emprego por decreto e o capitalismo popular que manteve as hostes expectantes ou acomodadas. Acabaram-se as certezas e é muito provável que esta ficção chamada Europa se desmorone mais cedo do que possamos imaginar. O colapso da moeda única encarregar-se-á disso.
Em vez de se atirar gasolina para o fogo, por estes dias deveríamos apelar aos valores mais perenes, assumindo-se reforçada a responsabilidade de defender o que se possa ainda salvar: a liberdade. Hoje o único apelo realista é ao estoicismo e sentido patriótico do cidadão. Citando uma vez mais Rui Ramos: “o rei Canuto mostrou um dia que não mandava nas ondas do mar*. Os manifestantes e eleitores europeus precisam de perceber que eles também não”. Uma inevitabilidade que abrange os socialistas portugueses.
* William J. Bennett O Livro das Virtudes
João Távora, Corta Fitas
Alguns Capitães de Abril, Mario Soares e outros socialistas anunciaram que não estariam presentes nas celebrações do Dia da Liberdade. Justificaram essa ausência por discordarem da governação que resultou da intervenção financeira internacional solicitada por Portugal.
Não participando nas cerimónias do 25 de Abril estes senhores recusam-se a aparecer ao lado do governo que não apoiam, mas neste dia especial e em especial, em que se celebra o regime democrático, mostram também que confundem o governo com o regime.
Para além da imagem que deixam para os historiadores do futuro, é a democrática quem mais perde.
Muito já foi dito e escrito sobre o massacre de um psicopata na Noruega, mas registo dois momentos da terrível novela que se encontra em fim de ciclo.
O primeiro prende-se com a primeira explicação avançada pela imprensa. A imaginação de alguns jornalistas noticiou que o atentado se devia ao envolvimento norueguês na Guerra do Afeganistão. A lógica é simples e linear, quem se mete com o islão leva. Nas entrelinhas deste raciocínio, apenas para quem o quiser ler, pode encontrar-se uma legitimação para o sempre ilegítimo terrorismo. É uma imagem dos media que supostamente nos servem. No seu melhor.
O segundo registo, mas com destaque, foi a elevação com que as autoridades norueguesas lidaram com a tragédia. Uma semana após o atentado Jens Stoltenberg, o primeiro-ministro quis assinalar a data escolhendo para o ponto alto da cerimónia a maior mesquita de Oslo. Ali discursou sobre democracia, multiculturalidade e tolerância. Dessa forma mostrou-nos aquilo que já sabemos, e que é: esses três conceitos são a resposta civilizada para o que já todos assumimos com um facto e que é o chamado choque de civilizações.
A escolha entre a barbárie e a civilização cabe-nos a nós.
A Central de Informação ao serviço do Governo PS, que já aqui mereceu um texto linkado, não vacila nem olha a meios para a luta contra quem se atreve a não aplaudir o Primeiro-Ministro.
Mais uma vez o alvo foi Fernando Nobre, que ainda não tendo entregue a sua declaração de IRS do ano de 2010, o que poderá ainda fazer durante o corrente mês, já viu divulgados os seus rendimentos na imprensa. Sabendo que no nosso país quem se destaca pela positiva é imediatamente vitima de inveja, é fácil de depreender que a intenção por detrás desta revelação seria enfraquecer a imagem pública do cabeça de lista do PSD por Lisboa.
Depois do muito que já vimos, quem se admira que a Central de Informação ao serviço do Governo PS recorra a dados da administração fiscal relativa aos cidadãos para disso fazer arma de arremeço político?
Perante este caso, que em qualquer país democrático abalaria os seus prepetradores, o silêncio e o encolher de ombros dos nossos media e dos cidadãos em geral mostra quão doente está a nossa democracia.
- Oh Paulo, porque é que os presidentes mentem?
Tiago, 7 anos
Notei que a revolução egípcia fez dividir a blogosfera que me merece atenção em dois lotes. Por um lado se identificam com o sistema democrático e que o consideram desejável para o ocidente, pois têm medo da vontade popular do mundo árabe. Estes podemos designar por cépticos. No outro encontramos os que acreditam na democracia como um estádio civilizacional que todos as sociedades merecem e aspiram. Estes são os belivers.
Churchill disse-nos a democracia era o pior sistema excluindo todos os demais, mas Hitler mostrou-nos como é possível ser eleito democraticamente e em seguida destruir um país e deixar um rasto de destruição na história da humanidade.
Eu sinto-me dividido. Seria fantástico ver os egípcios darem uma lição de democracia ao mundo em geral e aos cépticos em particular, mas neste momento nada está garantido e tudo pode ainda acontecer. O nosso PREC durou um ano e meio e até ao 25 de Novembro todos os cenários estiverem em aberto. Não sabemos quanto tempo durará o PREC egípcio nem qual será o seu próximo ponto de equilíbrio político. Até lá resta-nos apenas torcer para que os cépticos sejam contrariados.
Hoje é dia de reflexão. Amanhã é um dia em que os portugueses deveriam sentir alegria pelo exercício de um direito pelo qual se lutou durante décadas e, em alguns lugares do mundo ainda se luta. É pena mas encontramos mais facilmente cepticismo, desilusão e medo do que alegria.
Pelo contacto que tenho com um segmento específico e bem conservador dos portugueses, ouvi apenas falar em eleições pela boca de uns poucos, dos quais destaco duas fortes referências ao voto em Cavaco pelo medo dos outros, dos comunistas, dos radicais, da esquerda em geral. E não valeu a pena lembrar a facilidade com que aceitou a lei dos casamentos gay pois a resposta foi pronta: os outros fariam pior.
O conceito de auto-infalibilidade que Cavaco tem de si próprio, que quando se distrai o faz apresentar-se como uma espécie summit da evolução do homo politicus, é serôdio e idiota. Claro que numa segunda volta também eu votaria Cavaco contra o resto da esquerda, e digo 'resto' pois ele é também parte dela. Mas as sondagens garantem-nos que não vale a pena votar nele, pois já ganhou. OK, não leva o meu voto.
Posto isto, resta-me o voto irresponsável num dos restantes dworfs que constam no boletim de voto ou o ineficaz voto em branco.
Confesso que há algo na figura de Fernando Nobre que merece uns minutos de reflexão pré-eleitoral. Chega às eleições vindo de fora da partidocracia, não é fluente no politiquês, tem uma vivência internacional como nenhum outro candidato, foi ostracizado pelos media que gosta de gozar com os cromos (clarifico que todos estes pontos são para mim uma vantagem) mas tem um óbice tremendo... é um activista. Ter um activista como Comandante Supremo das Forças Armadas é algo assustador.
Talvez por culpa dos jornalistas que nunca ousaram perguntar-lhe, Nobre nunca nos informou o que pensa da NATO, nem do papel das nossas forças armadas no seu âmbito. Claro que nenhum dos outros candidatos foi confrontado com essa questão, mas à excepção de Alegre que está encravado entre o PS e o BE, a resposta de qualquer dos restantes candidatos seria previsível.
Talvez em jeito de uma epifania irreflectida, dei por mim a reparar que, da mesma forma que Cavaco não necessita do meu voto, este também não será suficiente para que Nobre ganhe. Além de que, confesso, há um cenário que amanhã me deixaria Alegre: ver Nobre como o segundo mais votado.
O melhor é ir votar cedo antes que isto me passe.
Leitura diária
Debaixo de olho
O Futuro e os seus inimigos
de Daniel Innerarity
Um livro que aposta numa política do optimismo e da esperança numa ocasião em que diminui a confiança no futuro. Boa parte dos nossos mal-estares e da nossa pouca racionalidade colectiva provém de que as sociedades democráticas não mantêm boas relações com o futuro. Em primeiro lugar, porque todo o sistema político, e a cultura em geral, estão virados apenas para o presente imediato e porque o nosso relacionamento com o futuro colectivo não é de esperança e projecto mas de precaução e improvisação. Este livro procura contribuir para uma nova teoria do tempo social na perspectiva das relações que a sociedade mantém com o seu futuro: de como este é antevisto, decidido e configurado. Para que a acção não seja reacção insignificante e o projecto se não converta em idealismo utópico, é necessária uma política que faça do futuro a sua tarefa fundamental
Teorema
Cachimbos: Marcas, Fabricantes e Artesãos
de José Manuel Lopes
O mais completo livro sobre cachimbos, da autoria do jornalista José Manuel Lopes, presidente do Cachimbo Clube de Portugal. Profusamente ilustrada, esta obra a que poderíamos chamar enciclopédica, dá-nos ainda em anexo uma completíssima lista de clubes e associações do mundo inteiro e dos seus sites.
Quimera